Valéria Peixoto de Alencar*
Especial para a Página 3 Pedagogia & Comunicação
A representação idealizada do índio é uma característica dos neoclássicos
Com a vinda da família real, em 1808, o Brasil passou de colônia a Reino Unido de Portugal. Depois, com a independência, em 1822, tornou-se, pelo período de 67 anos (até a proclamação da República, em 1889), um império independente.
Durante trezentos anos, nosso país foi essencialmente agrário e explorador de ouro, atividade que já começava a declinar no início do século 19. Um princípio de modernização, contudo, teve início com a chegada da corte portuguesa. A capital, Rio de Janeiro, passou a ser transformada segundo padrões parisienses. Seguindo esse objetivo, Dom João 6º convidou vários artistas, a conhecida Missão Artística Francesa, para que se estabelecessem no Brasil, com o objetivo de impulsionar o ensino da arte e a produção artística do nosso país, numa época ainda marcada pelo barroco. Esses artistas tinham como modelo o neoclassicismo.
Dentre esses artistas, destacamos neste texto Jean Baptiste Debret, figura fundamental, responsável por registrar parcela significativa das mudanças sociais daquela época, retratando os membros da monarquia, o povo, os costumes e vário aspectos da cultura. Os artistas da Missão Artística Francesa ajudaram a construir todo um imaginário sobre aquela época. Mas o que isso quer dizer?
Quando falamos de "imaginário", estamos nos referindo à reunião de elementos característicos da vida, da cultura de um grupo de pessoas, de um povo ou de uma nação. Por exemplo, pense nas gírias que você fala: de onde elas surgiram? Pense nas músicas que você ouve e nos filmes que você vê, ou, ainda, como era a roupa do Super-Homem nos quadrinhos da década de 1950 e como ela é hoje. Existe uma cultura típica do nosso tempo, da mesma forma que nos comportamos de uma maneira completamente diferente da de nossos avós, por exemplo.
Ninguém, atualmente, diz que uma pessoa bonita é um "broto", gíria típica dos nossos avós, e a roupa do Super-Homem é completamente diferente daquela usada pelo personagem de histórias em quadrinhos quando as primeiras revistas começaram a aparecer. Da mesma forma, uma mulher usar calças na corte de dom João 6º seria um comportamento imoral, inaceitável.
Ou seja, há costumes próprios de cada tempo, de cada época. E os artistas de um determinado período da história contribuem para o imaginário que construímos sobre essa época. Assim, as leituras e as interpretações que fazemos das imagens, das pinturas e das esculturas do passado estão marcadas pelas escolhas e pelos estilos desses artistas, mas também pelos nossos valores, pelas nossas crenças atuais, que formamos ao longo da nossa vida.
Debret documentou os acontecimentos da história brasileira no início do século 19. Ele e os membros da corte tinham consciência da importância da circulação de gravuras tratando de diferentes aspectos da vida no Brasil. Ou seja, eles se preocupavam com a divulgação da imagem do Brasil no exterior, principalmente pelo fato de o Brasil não ser mais apenas uma colônia, mas Reino Unido de Portugal.
Debret seria importante mesmo depois da Independência. Ele soube se transformar no pintor comemorativo oficial do império.Desde a morte de dom Sebastião, em 1578, nenhum rei português era retratado com a coroa colocada na cabeça, mas segurando-a ao lado do tronco, como se apenas o próprio dom Sebastião a merecesse, quando retornasse (dom Sebastião morreu na batalha de Alcácer-Quibir, em 1578, mas seu corpo jamais foi encontrado, o que deu início a um movimento chamado "sebastianismo", cujos seguidores acreditavam na volta messiânica de dom Sebastião).
Na pintura de que falamos acima, contudo, dom Pedro usa a coroa. Como você acha que isso foi percebido na época? Com certeza, serviu para enaltecer a figura do novo imperador e colaborou para a criação da imagem de dom Pedro como um herói.
Mas Debret não gravou apenas momentos que ele considerava importantes para a história ou cenas da vida da família real. Ele também documentou o cotidiano de pessoas comuns, sempre com um olhar neoclássico e, segundo alguns autores, já adotando a estética do romantismo.
Para entendermos a influência de Debret sobre o nosso imaginário, vamos observar e comparar a imagem do índio no início deste artigo e a do negro, que vem a seguir:
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Retirado de https://educacao.uol.com.br/artes/missao-artistica-debret.jhtm , em 16/03/10.
Descrição:
O quadro "Palmatória", de Debret, retrata escravos em um ambiente interno de trabalho, sendo que um deles é disciplinado com o instrumento punitivo palmatória, usado até o início do século XX nas escolas.
Proposta de atividade 1:
Observe esta obra de Debret.
Crie um texto, como se você fosse um dos personagens da obra, narrando esse momento. Descreva suas sensações e impressões.
Data de entrega:
A palmatória foi o instrumento de punição física de estudantes mais utilizado no mundo. Seu uso ainda é popular em alguns países orientais. Já no ocidente, a Inglaterra só a proibiu em 1989.
No Brasil, seu emprego foi introduzido pelos jesuítas, como forma de disciplinar os indígenas resistentes à aculturação. A prática foi perpetuada pela escravidão africana. Os senhores a utilizavam como um dos muitos castigos aplicados aos negros desobedientes. Ao final do século XIX, quando a educação dava seus primeiros passos em nosso país, a palmatória migrou para a escola.
Com as campanhas pelo fim da violência infantil da década de 1970, o castigo corporal foi condenado. Transformado em crime na década de 1980, o uso do instrumento foi defitivamente abolido com a elaboração do Estatudo da Criança e do Adolescente, em 1990.
Parece absurdo, mas apesar de todo o processo que levou ao fim da palmatória nas escolas, a discussão da violência como meio pedagógico continua.
Proposta de atividade 2:
Faça uma entrevista com pessoas que estudaram nas décadas de 60 e 70, pode ser seus ávos ou pais. Peça a eles para relatarem como era a estrutura física da escola onde estudavam, seus professores, seus colegas de sala. Peça a seu entrevistado para fazer um relato amplo de todo o seu cotidiano escolar, os métodos utilizados para punir alunos indisciplinados. Utilize o meio que preferir, pode ser escrita, como em uma entrevista para uma revista, o áudio como se fosse para o rádio, ou áudio-visual como se fosse para a televisão.
Data de entrega:
Blog Anselmo Raposo – retirado em 16/03/10.
Proposta de atividade 3: